quarta-feira, 18 de junho de 2008

O galeto mímico




Estávamos nós, eu e meu marido, fazendo um tour pela Europa, precisamente pela Suíça (Spiez, Interlaken, Berna e Zurique), Holanda (Amsterdam), Bélgica (Bruxelas e Brugges) e França (Paris), entre os dias 7 e 22 de setembro de 2007, quando aconteceu o fato a seguir relatado.
O passe de trem comprado por nós, aqui no Brasil (eurail pass, de 15 dias) realmente facilita o trânsito por vários países da Europa, dentre os quais, os acima referenciados. Após transitar pela Suíça e pela Holanda, resolvemos partir para Bruxelas, e de lá, pela proximidade, esticamos nosso passeio até a bela e pequenina cidade de Brugges, também na Bélgica.
Fizemos um belo tour a pé pelas ruas de Brugges, partindo da estação de trem, tempo em que conhecemos várias ruas, ruelas, praças, igrejas e canais, estes, que caracterizam, por excelência, o turismo nesta aconchegante cidade.
Pois bem, como disse anteriormente, o nosso tour redundou em se “passar sebo nas canelas” e se visitar, o quanto possível e enquanto a força física agüentasse, os pontos turísticos da cidade; neste esforço, visitamos a Torre do Campanário Belfry (marco da cidade desde os anos 1300), a Basílica do Sangue Sagrado (aonde existe uma urna contendo, supostamente, gotas coaguladas do sangue de Cristo), a Prefeitura (datada do final do século XIV e início do século XV) e o Lago do Amor (Minnewater Park).
Ao pé da letra, diria que batemos muito as pernas, num ir e vir constante... Assim, nada mais natural que o cansaço e a fome, a partir de certo tempo rodado (e que rodado!), passassem a prevalecer e arrefecer os ânimos, direcionando-nos a procurar um local para se fazer uma boquinha.
Mais umas passadas e nos deparamos com uma feirinha bem ao estilo de “veja, experimente e compre”; era tipicamente um mercado a céu aberto, com predominância de venda de roupas novas e usadas, barraquinhas de comes e bebes, e outros produtos típicos da região, a exemplo do delicioso chocolate belga.
Ao nos depararmos com um espaço vazio em um banco da pracinha do local da feirinha, meu marido não titubeou em sentar e arranhar seu francês de seis meses corridos, lançando ao ar seu estado de cansaço: je suis fatigué. Pronto! Sobrou para mim a missão de buscar a resolução do outro problema, o de matar a fome.
Percorrendo as barraquinhas de alimentos, deparei-me com uma que me interessava, visualizando nesta vários tipos de grelhados, a meu juízo, todos apetitosos. Então, restava-me manifestar, na língua local (francês ou belga), o desejo de transacionar com os barraqueiros. Bem, aí residiu o problema, pois sendo o nó francês ou belga, sequer me arrisquei a desatá-lo.
A fome nos arma de jeitos e trejeitos, mas mesmo assim, não conseguia identificar ao vendedor o grelhado que queria saborear...Era um “apontar” para aquele – não (com a cabeça e com os dedos negando); aquele outro – não; e por aí tentávamos chegar a um acordo, e nada!
Folheando um mini dicionário de francês, verifiquei a palavra porco e apontei para o vendedor, escusando-me de comprar tal grelhado; entretanto, não sei porque motivo, este não me entendia, tempo em que buscou ajuda através de mais dois outros vendedores, mas estes somente serviram para aumentar a “torre de Babel”.
Como uma idéia salvadora, lembrei-me de apelar para imitação do irracional grelhado pretendido. Foi quando, fechando as mãos, colocando os braços mais ou menos na forma de um “V” e os abrindo e fechando em direção ao corpo, consegui traduzir para o entendimento da língua francesa ou belga o desejo saciar o famoso galeto grelhado...
O resultado mais elementar do “cocorococó” mímico foi o ingresso imediato em curso de língua, não a francesa ou a belga, mas aquela que nos faz entender, presumo, em qualquer lugar do mundo, a inglesa – isto porque nem do “chicken” eu me lembrava...

FIM

O efeito do álcool no galego

Se a vida não me permitisse viver em comunidade, quer entre patrícios, quer entre outros estrangeiros, com certeza, o tempo me seria bastante ingrato. Viveria, quem sabe, numa “comunidade de Robinson Crusoé" em constantes movimentos nômades... O que se dizer, então, quando esta mesma vida me oferece a possibilidade de interação mútua, uma convivência mais estreita entre conterrâneos que, por força do destino, nos coloca longe de nossas origens, mas que, infelizmente, por desejos banais decorrentes da fraqueza carnal ou espiritual, termina em desabono das condutas morais antes vislumbradas?
Quando estou longe de minhas origens, em terras estrangeiras, a experiência me leva a buscar, na medida do possível, amizades com pessoas que, pelo menos, falam a nossa língua, visando, com isto, talvez, diminuir um pouco a ausência mais amiúde da terra natal; desejo, de início e, a partir daí, somente "matar a saudade" da sonoridade da língua. Entretanto, com passar do tempo, essa amizade desenvolve-se no sentido de uma relação mais próxima, diária, cordial, assistencial e, às vezes, por sermos brasileiros com características bem definidas no que tange aos laços fraternais, redunda essa relação num vínculo quase familiar, daí trazermos as pessoas para nosso recanto mais íntimo, nosso lar.
Conterrâneas que conheci na rotina do dia-a-dia da cidade longe da Pátria (mercado, ônibus, estação de trem, shows, rua etc), trouxe para dentro do meu lar, muitas vezes, embora apenas após um papo trivial, mas na esperança de, essencialmente, se ter, quem sabe, uma ajuda mútua, um ombro amigo, um conforto espiritual, ou mesmo, como se diz mais comumente, "para se trocar figurinhas".
Então, com o passar do tempo e a convivência mais estreita, sem muitas dificuldades, quando menos espero, estou dividindo com essa conterrânea a intimidade do meu lar: esta é minha casa, este é meu marido, este é meu filho, minhas coisas; aqui eu vivo, limpo, cozinho, lavo, cuido do meu filho, resumindo, faço às vezes da casa. Meu marido trabalha, sai cedo da manhã e volta somente à noite, fuma e bebe socialmente nos finais de semana; meu filho estuda; enfim, vivemos em paz, com saúde e a comodidade que Deus nos deu.
Talvez tenha ocorrido um pouco de excesso de confiança e de cordialidade de minha parte quando, sem procurar conhecer mais amiúde a respeito da conterrânea, ou mesmo por pensar que o fato da origem comum pudesse nos levar a concluir pela idêntica procedência do caráter moral, a trouxe, como se diz, "de supetão", à convivência do lar de minha família.
Se até o presente momento a verdade não se revelara, é porque o tempo não fora ainda suficiente a desmascarar a face imoral e pervertida que então se escondia nas entranhas mais perversas da natureza humana dessa conterrânea.
Bem ou mal, por conveniência ou comodidade material, ou pela busca de quem a sustente, ou, ainda, por pura fraqueza moral e espiritual, encontra-se a dita conterrânea casada e com filhos a criar. Identifiquei em sua fachada uma pessoa que tem também seus problemas de ordem material, que busca melhores condições de vida (o que, talvez, tenha motivado a casar com um estrangeiro, sem que tenha tido, quiçá, o sentimento próprio para tanto), e que, sem nenhuma discrição, é dada aos prazeres do álcool.
Todavia, a característica da hospitalidade brasileira e sua junção com a possibilidade de estender um ombro amigo à conterrânea, me fez convidá-la a frequentar mais vezes meu lar. Trocamos idéias, jogamos conversa fora, brincamos; ofereci-lhe uns lanches, uns drinques e, não mais tardar, até mesmo alguns pernoites, pois a casa em que dormem três, acomoda quatro, cinco...
Em um desses dias fatais, uma noite mais ou uma noite a menos não iria fazer diferença. Conversamos muito, comemos alguma coisa, bebemos o que tinha para beber, e as horas iam passando... No decorrer do tempo, supostamente, o corpo já não respondia aos impulsos da cabeça – é o álcool que começava a predominar sobre os sentidos. A conversa da conterrânea convidada já atropela, em parte, sua ação, que deveria ser comedida.
Na sala, na minha ausência momentânea, segue-se o assédio impróprio, indecoroso, desrespeitador, indecente, da conterrânea sobre o meu marido. Há a oferta verbal disso, daquilo e de outras coisas mais. E se já não bastassem as coisas ofertadas com palavras, eis que surge, como numa vitrine, a exposição visual das partes (mercadorias), que, diga-se, um tanto quanto depreciadas pelo tempo e, principalmente, pela falta de dignidade da conterrânea “comerciante”. A noite chega. É hora de acomodar as pessoas. Acomodaram-se...
O dia sucedeu a noite, amanheceu – nada mais trivial!
Ao amanhecer, toda dona de casa que se preza faz uma devida faxina nas dependências de seu lar: varre-se e limpa-se aqui, ali e acolá. O lixo acumulado de um dia para outro é, por demais, conhecido. Difícil mesmo é se procurar entender o aparecimento, após a virada dessa noite, de um preservativo ainda um tanto quanto umedecido...
Busco justificativas, mas encontro, no máximo e com muito senso de humanismo, apenas explicações.
Diz-se que a noite é uma criança, mas, às vezes, ela dá toda uma indicação de ter sido testemunha de um conluio de um pseudo-casal pervertido.
A suposta desculpa de que "na calada de uma noite regada a álcool as coisas acontecem", parece funcionar somente na mente daquelas pessoas que sequer resguardam uma moral mínima que se espera de uma pessoa casada e que fora convidada a adentrar no recinto familiar de um lar respeitado, ainda que antes aquela tenha aparentado possuir esse respeito, por si e pelos seus acolhedores. Lêdo engano!
A consideração e a amizade até então construída se esvaiu pelos mais ínfimos espaços possíveis, motivados que foram pela deselegância, desonestidade, oferecimento barato do próprio corpo em troca de uma aventura relâmpago puramente carnal e, principalmente, pelo excesso de confiança que depositamos nas pessoas que acolhemos como supostas "amigas".
A consciência (se é que se pode dizer da existência de uma consciência, neste caso) dessa conterrânea casada deveria avaliar a causa, extensão e efeito de sua ação, sabidamente, no mínimo, impensável. Reúno, aqui, alguns pontos que, de certa forma, podem auxiliar nessa sua autocrítica, a saber: devia ela pensar no prazer que tem uma legítima brasileira em ajudar uma conterrânea, abrindo as portas de sua casa, apresentando seu marido, seu filho, participando-a de um pouco de sua vida individual e a familiar; devia ela avaliar se o prazer momentâneo puramente carnal vale mais que alguns anos de convivência fraternal; aonde ela deverá buscar um novo ombro para chorar suas mazelas, pois conheço muito bem a frieza do estrangeiro; será que ela nunca pensou na possibilidade de uma responsabilização criminal ou civil decorrente de seu ato; e, se a vulgaridade de seu ato chegar ao conhecimento de seu marido, qual será sua reação?; será que tamanha desqualificação de conduta moral tinha o condão inicial de causar unicamente a desarmonia de uma família até então perfeita?; e, o que pensar, então, dos desígnios de Deus?
Questiono-me se tal atitude poderia ser uma tanto quanto relevada, quando tenho conhecimento que essa conterrânea, talvez, por imperativo do destino, teve a condição de ser privilegiada por uma educação que lhe oportunizou uma educação a ponto de não lhe permitir tamanha desventura; no entanto, sabendo-se que a dita concubina sempre alegou a paternidade de um suposto médico e que sempre teve anseio por uma formação de nível superior, então, com esse “perfil”, o que seria o mínimo a se esperar?
Por tudo, posso dizer que isto é o resultado da fragilidade humana (daquela que cede ao primeiro desejo da carne); mas, felizmente, louvou-me de minha própria atitude, eis que, com lampejos espirituais frequentes, tudo relevo, tudo perdôo, pois sei que o quinhão de cada um a Deus pertence.

FIM