segunda-feira, 7 de setembro de 2009

Meu primo

Nesses primeiros anos de Teresina, um primo meu veio morar conosco, tempo em serviu o Exército. Por esse tempo, meu pai tinha um jeep ano 1959, e, como meu primo era metido a mecânico, quando de suas folgas de final de semana, o mesmo se metia dentro do capô desse jeep e tratava de colocá-lo em condições de funcionamento – era praticamente o dia todo melado na graça para, numa volta experimental, a gente ficar novamente “no prego”, a empurrar o chamado “casquinha” pelas ruas até “pegar”. Um dia, numa dessas voltas experimentais, meu primo ia passando por uma rua quando um grupo de três moças, sem nenhum razão, achou de zombar do carro e de seus passageiros; ato contínuo, meu primo olhou para elas, deu aquele grito com um tremendo palavrão regado com uma dedada daquelas! Ainda lembro o constrangimento das moças, digamos, com o rabo entre as pernas...
É também desse meu primo o “grande” incentivo que tivemos, eu e meu irmão mais novo, para trocarmos tapas e murros por besteiras triviais, a exemplo de apelidos, quebra do carro de madeira, batida de carro de rolimã etc, pois, quando tal ocorria, esse primo ficava nos insultando, um ao outro, até que “o pau” começasse..., e depois, quando alguém separava a briga e nossa mãe perguntava a causa, o primo, na maior desfaçatez, alegava que não tinha nada a ver com aquilo...

A paixão pelo futebol


Meu amor bem particular pelo esporte bretão se delineou quando morava em Parnaíba (PI), pois meu pai gostava de ouvir as transmissões das partidas futebolísticas da capital piauiense através das estações de rádios em amplitude média (AM), as ditas Rádio AM, e ele era um torcedor árduo do então Piauí Esporte Clube, famoso na época, e então identificado carinhosamente por “Piauizão Vibrante”. Ainda que com este indicativo paterno, confesso que não consegui me decidir pelo “Piauizão”, pois, viciado pela locução esportiva, um dia ouvi pelo rádio, com a costumeira “chiadeira” de sempre, uma partida entre o River Atlético Clube e o Flamengo Esporte Clube (times da capital piauiense), cujo resultado importou na vitória deste último por dois a zero, e, daí em diante, me fez torcer pelo rubro-negro piauiense, paixão que perdura até os dias de hoje.
O carinho pelo Flamengo piauiense extrapolou divisas e me fez, com muito mais paixão, alcançar a nação rubro-negra do Flamengo carioca, principalmente, anos depois, com o surgimento de craques como Zico, Andrade, Adílio, Geraldo, Leandro, Júnior etc.
Esse amor pelo futebol cresceu assustadoramente quando da realização da Copa do Mundo de 1970, pois, sendo a primeira vez que ocorria a transmissão, via Embratel, pela televisão, pudemos assistir ao vivo o desenrolar dos nossos craques canarinhos passeando pelos gramados do México. Estavam lá, enchendo os olhos dos mexicanos e do resto do mundo, estrelas que foram eternizadas pelos torcedores, a exemplo de Jairzinho, Gérson, Tostão, Rivelino, Carlos Alberto, Clodoaldo e, a maior e mais reluzente de todas, Pelé! Mesmo com apenas onze anos à época, lembro do sofrimento da primeira partida (Brasil versus Inglaterra), sofrimento esse pela dificuldade da partida em si, que terminou com a vitória canarinho por um a zero, bem como pelo desconforto da sala em que nos encontrávamos assistindo o jogo – é que, como não tínhamos televisão, o vizinho de frente de nossa casa, com cortesia, acolhia todos aqueles que não possuíam esse aparelho, o que redundava em espalhar pessoas por todos os cantos da sala, e, na ausência de cadeiras para todos, sobrava para os meninos o chão... De qualquer forma, nem a dureza do chão durante os noventa minutos da partida diminuiu a vibração que coroou a festa quando da final da Copa, logrando a Seleção Brasileira em aplicar uma sonora goleada (quatro a um) na então Seleção da Tchecoslováquia.
Assim, essa paixão pelo esporte bretão foi crescendo a cada dia, mas não se resumiu apenas em ouvir ou assistir as pelejas futebolísticas; de então, passei a ser um contumaz praticamente de tão delicioso exercício físico, a ponto de, como tal, ser este o único e confessado vício que me acompanhou por todos esses longos anos de vida. Neste sentido, todas as minhas residências da infância, adolescência e juventude sempre foram marcadas pela existência de um campinho de “peladas” (ou de várzea, para alguns) nas imediações, o que me possibilitava correr atrás da bola
e desenvolver essa arte, mesmo sem a intenção de me tornar um “craque”, mas, também, longe de me considerarem um candidato a “perna de pau” – eu diria, dei meus passes (que os atuais locutores esportivos chamam de “assistência”), fiz meus goolzinhos, pisei algumas vezes na bola (até Pelé deve ter dado suas pixotadas), acusei muitos juízes de ladrão (quando eles apitavam as “peladas”), discuti e, por certo, cheguei às vias de fato algumas vezes, mas sobrevivi, ainda que como um legítimo peladeiro.

De medíocre a aluno exemplar

Como que por um milagre, mudei de um aluno medíocre da Escola Monsenhor Roberto Lopes para, sem falsa modéstia, aluno esforçado do Grupo Escolar Félix Pacheco, em Teresina, e, por conta disso, merecedor, a cada final de ano, de um presente de minha marcante professora Esmelinda (pelo tempo, não tive mais notícias dela), por figurar entre, sempre, os três primeiros lugares da classe, sendo tal massagem de ego, repetida ao longo de todo o primário, ginásio (Instituto Elias Torres, do conhecidíssimo prof. Francisco das Chagas Marques Figueiredo) e ensino médio, no Liceu Piauiense (só que nestes já não existiam mais os presentes materiais, mas de palavra, o que também ficaram registrados na minha memória e me fizeram bastante diferença).

A segunda paixão


Minha segunda “paixão” ocorreu quando frequentava o 2º e 3º anos primários, e recordo que a Carla era linda, olhos verdes. Como da primeira vez (Justina), lembro que não houve correspondência material no sentimento, embora a própria irmã dela (Lúcia) torcesse para tal. Muito tempo depois, ambos já adolescentes, continuei a manter o mesmo sentimento por essa menina, mas nada aconteceu, mesmo com o patrocínio contínuo da irmã dela.

A Casa Saló

Como haveria de esquecer a loja da dona Saló, aonde, creio, devo ter exercido minhas primeiras atividades de empregado mirim, seja na condição de empacotador, seja como vigia dos produtos expostos à venda? Ou mesmo pela amizade que tive com o neto dela, Alexandre, cujo proveito maior era lanchar na casa dela e passear aos domingos de carro!

O picolé "quichuá"


Perto de nossa casa existia uma fábrica de picolé e sorvete, cuja marca levava o nome de “quichuá” (não me recordo se a grafia era exatamente esta, mas da pronúncia, não tenho dúvida); essa fábrica costumava diariamente mandar vender os seus produtos nas cidades vizinhas de Teresina (Caxias, Timon, Demerval Lobão etc), e, à noite, quando os carros retornavam com o restante não vendidos, fazia a nossa festa, pois o dono da fábrica mandava distribuir os picolés e sorvetes moles para a garotada que ficava à espreita, ao redor do carro – diga-se: os produtos vinham, ainda, em condições de serem apreciados, inclusive, dependendo da “feira”, sempre sobravam alguns para serem levados para casa.

A dentista e os dentes de ouro


Da infância lembro os males causados pelo medo do dentista, o que, além das dores, se refletia num sorriso externamente doentio, eu diria, um prato cheio para qualquer prático e uma festa para os diplomados – é interessante dizer, quanto a estes, que em uma das visitas a um consultório dentário, uma odontóloga chegou a diagnosticar a necessidade de três dentes frontais (como se diz no cotidiano, “dentes da frente”) de ouro! – como então seria um sorriso desses? Imagino que seria uma verdadeira “Serra Pelada”!
Nunca me esqueci disto, sem, no entanto, à época, já ter consciência para concluir que muito existia, por parte da dita profissional, o desejo do lucro de maneira mais breve.
As mazelas da imprevidência com os dentes me acompanharam ao logo de minha vida adolescente, mas, felizmente, após quebrar um “da frente”, já fragilizado pelas cáries, numa pelada no campo da “Quinta Velha”, próximo de minha casa, criei, de um a hora para outra, o desejo e a vontade de reparar o tempo perdido, reparação essa que me acompanhou, me acompanha e acompanhará pelos anos sem fim.

Um "trombadinha" que não se materializou

Nossa casa ficava bem próxima do mercado central de Teresina, precisamente, dois quarteirões. Um dia eu fui a esse mercado com minha mãe e, passando por uma lojinha próxima àquele, observei, dentre os vários sacos à frente da mesma, que um continha petecas coloridas de vidro (também conhecida por bilas ou bolinhas de gude) e, enquanto minha mãe conversava com o vendedor lá dentro da lojinha, aproveitei a surdina para colocar várias petecas no meu bolso; após minha encerrar a compra de alguma coisa, saímos e, inocentemente (ou por obra do Superior), mostrei para minha mãe as petecas que havia surrupiado – não deu outra: puxões de orelha, uns coques e cascudos distribuídos e a obrigação, no mesmo momento, de devolver o que não me pertencia, portanto, com certeza, foi menos um “trombadinha” que não se materializou!

A casa da Rua João Gayoso

Moramos inicialmente na Rua João Gayoso, a dois quarteirões da Praça da Bandeira, local aonde existia o zoológico de Teresina, posteriormente, este foi transferido para o atual Zoobotânico, localizado no bairro Socopo. A casa era, ao mesmo tempo, residência e depósito de óleos lubrificantes do posto de gasolina em que meu pai trabalhava, pois essa casa era também de propriedade do patrão dele. Entre as caixas de óleo nós brincávamos de esconde-esconde, de bandido e mocinho.